Lokan e O Fantasma

 


Na vastidão de uma floresta sem nome, onde árvores antigas sussurravam segredos em línguas esquecidas e a luz do sol mal conseguia atravessar as copas densas, três figuras moviam-se em silêncio. Elden, o elfo guerreiro, liderava o grupo, com sua armadura leve reluzindo levemente sob o véu esverdeado da floresta. Ao seu lado, caminhava Elza, a clériga de cabelos prateados, com um cajado nas mãos e uma aura de serenidade que contrastava com a escuridão ao redor. Atrás deles, em passos firmes, vinha Lokan, meio elfo, meio orc, uma mistura de força bruta e sagacidade, com sua mão sempre próxima ao cabo da imensa espada em suas costas.

As histórias haviam chegado até eles de forma vaga e misteriosa. Moradores de vilarejos vizinhos falavam de um castelo abandonado no coração da floresta, um lugar esquecido pelas eras. Mas recentemente, estranhos acontecimentos começaram a ser relatados. Pessoas que ousavam se aproximar do castelo nunca mais eram vistas. Outras retornavam em estado de choque, balbuciando sobre uma figura pálida, etérea, que emergia das sombras do castelo, perseguindo qualquer um que ousasse entrar em seus domínios.

— Acha que são apenas histórias para assustar crianças? — perguntou Lokan, rompendo o silêncio enquanto movia um galho que bloqueava seu caminho.

— Não podemos descartar nada — respondeu Elden, com um tom sério. — Já enfrentamos coisas piores do que fantasmas.

Elza permaneceu calada, mas seus olhos brilhavam com preocupação. Ela sabia que, mesmo que fantasmas fossem raros, os poucos que cruzaram seu caminho foram muito mais difíceis de lidar do que criaturas físicas. Espíritos atormentados não se dobravam a espadas nem a feitiços convencionais.

Após horas de caminhada, o trio finalmente alcançou o local. O castelo abandonado erguia-se diante deles, uma estrutura imponente que parecia ser engolida pela vegetação. Trepadeiras cobriam as paredes de pedra desgastada, e as torres, outrora majestosas, estavam em ruínas. Um vento frio soprava entre as fendas das pedras, trazendo consigo um lamento distante.

— Estranho — murmurou Elden, enquanto observava o castelo com atenção. — Não há sinais de vida, nem mesmo de animais. É como se este lugar estivesse morto há séculos.

— Mas algo ainda vive aqui — disse Elza, seu tom suave carregando uma gravidade incomum. — Eu posso sentir. Algo... antigo.

O grupo avançou cautelosamente em direção ao portão principal, que estava caído no chão, quebrado e enferrujado. Ao atravessarem a entrada, uma sensação pesada caiu sobre eles, como se o próprio ar estivesse saturado de medo e angústia. A luz do dia, que já era fraca na floresta, parecia ser completamente absorvida pelas sombras do castelo, tornando tudo mais sombrio e opressor.

— Este lugar está encharcado de morte — Lokan disse em voz baixa, sua mão instintivamente apertando o cabo de sua espada.

Conforme se aventuravam mais fundo no castelo, os sons do lado de fora foram desaparecendo. O ambiente parecia absorver qualquer ruído, deixando apenas o som dos seus próprios passos ecoando pelos corredores desolados. As paredes estavam cobertas de musgo e as tapeçarias, outrora grandiosas, agora eram apenas trapos esfarrapados pendurados em suportes enferrujados.

No grande salão, os restos de uma tapeçaria desfeita pendiam de uma viga quebrada, e o que parecia ter sido uma lareira majestosa estava agora cheia de cinzas antigas. Foi ali que Elden parou abruptamente, levantando uma mão para sinalizar aos outros.

— Sinto algo... diferente — disse ele, seus olhos focando em um ponto no ar. — Está frio... como se...

Antes que ele pudesse terminar sua frase, uma figura nebulosa começou a se materializar diante deles. Aos poucos, uma forma translúcida tomou forma, flutuando a poucos metros do chão. Era uma figura esquelética, vestida em trapos que, em outro tempo, poderiam ter sido roupas nobres. Seu rosto, pálido e cadavérico, estava congelado em uma expressão de ódio puro, e seus olhos vazios irradiavam uma luz espectral.

O fantasma gritou, um som agonizante que fez o ar vibrar ao redor deles. As chamas de Elza, normalmente quentes e acolhedoras, tremeluziram em resposta, como se a própria energia ao redor fosse drenada pelo espírito atormentado.

— Fiquem atrás de mim! — gritou Elden, desembainhando sua espada e assumindo uma postura defensiva.

Mas Elza sabia que uma espada, por mais afiada que fosse, seria inútil contra um espírito. Ela começou a entoar um cântico antigo, suas palavras ecoando pelo salão, tentando conter a presença maligna que flutuava diante deles. A magia sagrada que ela invocava brilhou ao redor do grupo, formando uma barreira de luz purificadora.

O espírito, no entanto, não recuou. Ele avançou, atravessando a barreira de luz com um grito furioso, como se o ódio que o alimentava fosse maior que qualquer feitiço. Elden tentou golpeá-lo, mas a lâmina passou direto por ele, como se estivesse cortando o ar.

Lokan, vendo a futilidade da luta física, recuou para junto de Elza, seus olhos vermelhos estreitando-se enquanto ele observava o espírito. Ele já enfrentara horrores antes, mas este era diferente. Este ser não era uma mera criatura da floresta. Era algo profundamente corrompido, preso entre o mundo dos vivos e dos mortos, alimentando-se do medo e do sofrimento.

— Precisamos descobrir o que o mantém preso aqui! — gritou Elza, enquanto suas palavras mágicas falhavam em conter a entidade.

O fantasma continuou sua investida, seu corpo translúcido flutuando cada vez mais perto, enquanto seus gritos ecoavam pelos corredores vazios do castelo. Elden recuou, suas tentativas de atacar cada vez mais infrutíferas. Ele sabia que precisavam de mais do que força bruta para derrotar tal criatura.

— Alguma ideia? — Lokan rugiu para Elza enquanto se afastava de uma investida do espírito, sua grande espada agora inútil.

Elza fechou os olhos por um momento, buscando nas profundezas de sua memória os ensinamentos antigos que poderiam oferecer uma pista. Ela sabia que fantasmas não permaneciam neste plano sem motivo. Algo o prendia, algo o mantinha enraizado ao castelo.

— Há algo que ele deseja... — murmurou Elza. — Algo que ainda o liga a este lugar.

Antes que ela pudesse dizer mais, o espírito lançou um ataque violento. Suas mãos etéreas se estenderam em direção a Elden, que foi jogado para trás com uma força invisível, batendo contra uma parede de pedra. Ele caiu de joelhos, ofegante.

— Elden! — gritou Lokan, avançando em direção ao amigo, mas o espírito bloqueou seu caminho, aproximando-se como uma sombra de morte.

Elza, em desespero, correu para Elden, colocando as mãos sobre seus ombros e recitando um feitiço de cura. As luzes suaves do feitiço de cura envolveram o guerreiro, mas o espírito parecia alimentar-se de sua magia, ficando mais forte a cada momento.

Lokan rugiu, levantando sua espada, mas hesitou, sabendo que era inútil. Não havia como cortar o que não era sólido. Ele olhou para Elza, esperando que ela tivesse uma solução antes que fosse tarde demais.

— Elza, rápido! — gritou Lokan, enquanto a figura fantasmagórica se aproximava, seu rosto cadavérico distorcido em uma expressão de ódio interminável.

Elden, de pé, ainda com dificuldade, sentiu a escuridão se aproximar. O ar ao redor ficava mais pesado, e o frio gelava até seus ossos.

— Precisamos encontrar o que o mantém aqui... algum objeto, algo... — Elza murmurou apressadamente.

Elza, com os olhos fechados e a respiração controlada, sentia a energia pesada e opressiva que dominava o castelo. O espírito estava amarrado àquele lugar por algo muito antigo e poderoso, mas ela sabia que, se conseguisse libertar o castelo de sua influência, o fantasma seria forçado a partir. Concentrando-se em seu treinamento de clériga, ela começou a murmurar uma antiga invocação de purificação. O ar ao seu redor brilhou com uma luz suave, enquanto símbolos sagrados começaram a se formar no chão embaixo dela, iluminando a escuridão como estrelas no céu noturno.

Enquanto Elza trabalhava, o fantasma avançava cada vez mais rápido em direção a Elden e Lokan. Seu grito ecoava pelo salão, um som de dor, ódio e desespero que fazia a pele arrepiar e os corações pulsarem de medo. Elden, com sua espada em mãos, tentou desviar, mas a figura etérea era rápida e implacável. O espírito atacava como uma tempestade, movendo-se em direções imprevisíveis, suas garras fantasmagóricas atravessando o ar em busca de carne.

— Fique longe! — rugiu Lokan, brandindo sua espada gigantesca. Apesar de saber que as armas físicas não teriam efeito sobre o espírito, o meio-orc não se intimidou. Ele avançou com um ataque brutal, sua lâmina cortando o ar com um assobio ameaçador. A espada passou pelo corpo translúcido do fantasma sem efeito, mas o movimento serviu para distrair o inimigo, desviando sua atenção de Elden.

O fantasma flutuou para trás, recuando, e então investiu contra Lokan, atingindo-o com uma força sobrenatural. O meio-orc foi lançado contra uma parede de pedra, rachando-a com o impacto. Ele caiu de joelhos, o ar forçado para fora de seus pulmões, mas, obstinado, ergueu-se novamente.

— Lokan! — gritou Elden, sua voz cheia de preocupação, mas ele não tinha tempo para ajudar. O fantasma agora voltava sua atenção para ele, seus olhos brilhando com uma luz sinistra.

Elden, com seus reflexos rápidos, desviou para o lado enquanto o espírito lançava uma investida. Suas garras etéreas passaram a poucos centímetros de seu rosto, e ele sentiu o frio gélido que parecia querer sugar sua própria alma. A espada de Elden, forjada com metal antigo, não conseguia ferir o espírito diretamente, mas cada golpe que ele desferia parecia retardar os movimentos do fantasma, como se ele estivesse forçando a criatura a manter-se no mundo físico.

O elfo guerreiro e o meio-orc lutavam para conter o espírito, mas sabiam que não poderiam vencê-lo com força bruta. Apenas Elza poderia resolver aquilo.

— Elza! Não temos muito tempo! — gritou Elden, sua voz ecoando pela sala.

Elza, no centro do salão, estava agora cercada por uma luz brilhante. O feitiço de purificação estava em seus estágios finais, mas exigia concentração e poder. A clériga começou a elevar o tom de sua voz, suas palavras místicas ecoando em harmonia com as energias ao seu redor. Seu corpo brilhou com uma luz prateada, e as runas no chão brilharam mais intensamente, crescendo e se espalhando pelas paredes do castelo.

Enquanto o feitiço tomava forma, o fantasma, sentindo a ameaça iminente, soltou um grito terrível e lançou-se em direção a Elza, sua fúria crescendo. Lokan, mesmo ferido, ergueu-se mais uma vez e correu para interceptá-lo. Ele ergueu sua espada no último instante e bloqueou a trajetória do espírito com o corpo, sendo arremessado violentamente para o lado. A força do impacto foi devastadora, mas o ato heroico deu a Elza os segundos preciosos de que precisava.

— Agora! — gritou Elza, sua voz ressoando com poder.

A luz ao seu redor explodiu em um raio brilhante, enchendo todo o salão com uma claridade cegante. O espírito foi atingido em cheio pelo feitiço de purificação. O grito que soltou foi ainda mais aterrorizante, uma mistura de raiva e dor enquanto sua forma começava a se desintegrar diante deles. Seu corpo espectral se contorceu, tentando resistir, mas a magia sagrada era implacável.

O castelo inteiro pareceu estremecer quando a força do feitiço percorreu cada pedra, cada sombra. A escuridão que se agarrava às paredes foi expulsa pela luz, e o ambiente começou a se purificar. Os símbolos mágicos de Elza espalharam-se por todo o castelo, formando um círculo completo de purificação que prendia o espírito em um campo de energia.

— Volte para o mundo dos mortos de onde veio! — gritou Elza, suas mãos levantadas enquanto canalizava a última onda de poder.

O fantasma lançou-se contra a barreira, mas foi empurrado de volta, como se uma força invisível o estivesse prendendo. Seu corpo começou a se fragmentar, pedaço por pedaço, até que, com um grito final, ele foi completamente banido deste mundo.

A luz diminuiu gradualmente até se extinguir completamente, deixando o salão mergulhado em um silêncio profundo. As sombras haviam desaparecido, e o castelo, por mais sombrio que fosse, parecia agora... vazio, como se a presença maligna que o habitava há tanto tempo tivesse finalmente partido.

Lokan estava no chão, sua respiração pesada e dolorosa, mas ele sorriu ao ver que o fantasma havia desaparecido. Elden, também exausto, caiu de joelhos ao lado de seu amigo.

— Conseguiu... — disse Lokan, entre ofegos. — Sabia que conseguiriam.

Elza, cambaleando devido ao esforço, se aproximou dos dois. Ela colocou a mão sobre o ombro de Elden e então sobre o de Lokan, recitando um breve encantamento de cura. Uma luz suave envolveu seus companheiros, curando suas feridas superficiais e aliviando a dor.

— Isso foi... mais difícil do que eu esperava — disse Elza, exausta, mas satisfeita com o resultado. — Mas o castelo está purificado. O espírito foi banido para o outro mundo. Não voltará mais.

Elden assentiu, levantando-se com dificuldade.

— E quanto ao que o mantinha preso aqui? Você descobriu o que era? — perguntou ele.

Elza olhou ao redor, seu olhar analisando os cantos do salão. Por um momento, tudo parecia em paz, mas então seus olhos se fixaram em algo brilhante no chão, próximo à lareira desfeita.

— Ali — ela murmurou, apontando.

Os três se aproximaram com cautela e viram um antigo medalhão de ouro, sujo e desgastado pelo tempo, mas ainda incrivelmente detalhado. Símbolos antigos estavam gravados em sua superfície, e mesmo com o espírito banido, o artefato ainda irradiava uma leve sensação de poder.

— Deve ser isso — disse Elza. — Este medalhão deve ter pertencido ao fantasma em vida. Provavelmente, foi o que o manteve preso ao castelo por tanto tempo.

— E agora? — perguntou Lokan, ainda ofegante, mas visivelmente mais relaxado.

— Agora, devemos destruí-lo — respondeu Elza. — Sem isso, o espírito não poderá retornar.

Elden pegou o medalhão cuidadosamente, sentindo a energia maligna remanescente que ele ainda carregava. Ele olhou para Elza, que assentiu, e com um movimento firme, ele esmagou o artefato contra uma pedra. O medalhão se quebrou em pedaços, liberando uma breve explosão de luz antes de desaparecer completamente.

O trio ficou em silêncio por alguns momentos, observando o pó dourado se dissipar no ar.

— Bem — disse Lokan, finalmente rompendo o silêncio. — Acho que podemos considerar isso um trabalho bem-feito.

Elden e Elza riram levemente, aliviados. O castelo estava purificado, e o espírito que tanto aterrorizava a região havia sido banido para o outro mundo, sem chance de retorno.

— Vamos sair daqui — sugeriu Elden. — Esta floresta nunca mais será a mesma, mas nosso trabalho está feito.

Com os primeiros raios de sol penetrando pelas janelas quebradas do castelo, os três heróis se voltaram para a saída, prontos para deixar o lugar que quase custou suas vidas. Mas algo ainda parecia incomodar Elza, uma sensação estranha em sua mente...

 

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